Quem merece ajuda? Ora, todo mundo em um momento ou outro, não é? Mas será mesmo? Aqui na capital da China uma conhecida russa, que é regente da Orquestra Internacional de Pequim, me perguntou se poderia ajudá-la a levantar dinheiro para crianças necessitadas. Ela está organizando um concerto para tal fim. Como eu, através das artes cênicas, já havia ajudado mulheres pobres no interior do país, achei que poderia fazer algo parecido, mesmo que em uma escala menor do meu último espetáculo. Produziria e dirigiria uma peça teatral.
A diretora da ONG em questão entrou em contato comigo agradecendo pela minha boa-vontade. Eu repliquei: – Mas é claro! Estou meio curta de tempo esse ano, mas darei um jeito para ajudar os órfãos com um espetáculo. Ela então disse: – Eu acho que você está enganada. Não se trata de órfãos, mas de crianças cujos os dois pais ou somente o pai ou a mãe estão na prisão sem data para sair. Eu fiquei muda.
Sempre achei que uma vez ou outra poderia fazer um pouco de bem para a humanidade se doasse dinheiro arrecadado na bilheteria dos meus espetáculos, já que não tenho dom para outras funções. Mas devo ser sincera: Filhos de criminosos? É claro que a pergunta que seguiu automaticamente na minha cabeça foi: Mas o que as crianças tem a ver com os erros dos pais? Obviamente as crianças não tem culpa e sobre isso não tem discussão! No entanto, sou obrigada a pensar se os tais pais teriam cometido esse ou aquele delito se tivessem pensado nas consequências para os seus filhos que ficam a mercê do destino caso não houvesse boa vontade de estranhos. Esse ideia parece ser dura e fria (e talvez até seja), mas sob o ponto de vista social, vale pelo menos uma reflexão.
Baseando-me só um pouquinho nos princípios de Darwin, a Lei da Selva (de pedra ou a de mato mesmo) é a lei do mais forte. Mas será que é bom só pensarmos em ajudar os outros o tempo todo, excluindo crianças inocentes? Será que é bom proteger aqueles que se escondem por detrás da própria fraqueza ou ignorância? Dessa forma, os mais fracos serão engolidos pela sociedade e nunca terão chance de crescerem. O psicólogo Herbert Spencer (seguidor de Darwin) uma certa vez disse:
Se a ignorância fosse tão segura quanto a sabedoria, ninguém se tornaria sábio.
Ajudar é cristão, mas nem sempre é a melhor coisa a se fazer. Quem conhece as obras do britânico George Bernard Shaw (ganhador do Premio Nobel da Literatura) certamente já refletiu sobre a questão da ajuda ao ler ou assistir no teatro a peça Widowers’ Houses (Casas de Viúvas). Nela o personagem Sartorius explora a miséria alheia para alugar barracos que lhe pertencem, quando com o dinheiro recebido poderia estar oferecendo moradias mais decentes. Ele se explica para o futuro genro: “Quando as pessoas são muito pobres, não podemos ajuda-las, não importa o quanto venhamos a simpatizar com elas. Isso faria mais mal do que bem nos anos a virem”. De fato, esse é um assunto delicado já que todos nós gostaríamos de receber ajuda se precisássemos dela, mas viver de ajuda de terceiros pode se tornar um vicio e levar à preguiça, ao comodismo.
Para ilustrar, lembrei-me de uma caso de alguém que conhecia e que já passou dessa para melhor. Essa pessoa que vivia uma vida para lá de modesta era idosa e já não podia mais trabalhar pela idade avançada e pela saúde fraca. Por isso ela recebia uma merecida ajuda financeira para cobrir certos gastos. No entanto, uma de suas filhas com um parafuso a menos causava grandes preocupações. Sem ter completado nem o colegial, engravidou várias vezes de diversos parceiros e nunca conseguia se segurar em emprego nenhum por sempre arrumar confusão. Os filhos dela quem cuidava era essa minha conhecida. Quantas brigas não presenciei quando os outros membros da família eram contra a ajuda eterna? Assim que a maluca percebesse que não receberia mais apoio moral nem financeiro, talvez parasse de aprontar um pouco e se tornasse mais responsável…
Falando sobre outra pessoa que conheço, o sujeito hoje na faixa dos sessenta costumava a ser aventureiro, feliz e até ganhava dinheiro. Depois de se casar, sua vida mudou como para a maioria daqueles que se casam. No entanto, suas preocupações além das financeiras, passaram a ser morais. Ele simplesmente tem medo de sair de casa para não ter encontrar sua esposa – cronicamente depressiva – caída no chão após ter se suicidado. Uma amiga que já passou por uma crise depressiva me contou que achava que se ficasse depressiva, sairia dessa rápido pelo sua força interior, mas que a realidade mostrou ser bem diferente. Ela precisou de ajuda: de terapia e de remédios e hoje está melhor. Já a esposa desse meu conhecido parece não melhorar nunca. Resultado: aquele homem com vontade de viver, que adorava viajar e se aventurar em diversos negócios, passou a ter uma vida sedentária e sem graça somente para ficar com a mulher que não vive, mas vegeta. Isso é justo? Amor é estar com o outro em situações difíceis, mas amor também é libertar o amado e deixá-lo viver quando você já desistiu da vida.
Outro dia estava assistindo um programa de televisão do canal “BIO” (para quem conhece) que mostrava a desgraça de uma família de classe alta dos Estados Unidos. Olhando a casa de fora, os carros na garagem, a grama cortadinha do jardim, parecia que tudo estava perfeito, no entanto um dos filhos adolescente do casal era viciado em heroína e crack. A luta para tirar o filho dessa parecia não ter fim. Conversas, dramas, chantagens emocionais, nada dava jeito. Quando o filho tentava ficar longe das drogas, o que era raro, os pais o trancavam dentro do seu quarto, com seu consentimento. Os gritos e o desespero do filho dentro do quarto sem as drogas eram tamanhos, que obviamente a família sofria junto. Quando passado alguns dias ou somente algumas horas o filho saia do quarto louco para ir para a rua. Todos da família já sabiam atrás do que ele iria. Então, com o coração na mão, a mãe do jovem dava dinheiro para ele comprar drogas para não ver o seu filho sofrer mais. Na entrevista ela dizia saber que o que fazia estava errado, mas que precisava ajudar o filho.
Não irei comentar o parágrafo acima apesar de ter minha opinião a respeito, porque a ideia desse texto e de levar meus leitores a refletirem sobre o assunto sobre quem merece ajuda de verdade, fora emergências. Minha bruta honestidade às vezes é má recebida, eu sei, mas eu pelo menos tenho a coragem de expô-la. Agora, podem jogar as pedras…
Sigrid diz
Sou sua fa de carteirinha, prefiro um milhao de vezes sua bruta honestidade que “palavras ao vento”, detesto gente que fica falando coisas so para agradar ou parecer educado……..